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1. |
Vento - Brisa Marques
02:30
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Às vezes tenho a voz embargada
e as mãos trêmulas
Será que sentir fome é isso?
Nosso primeiro grito: a fome.
Cozinho uma verdura, mas não tenho horta.
A qualquer hora,
o céu pode desabar sobre nossas cabeças.
E onde irá bater os nossos corações?
Me seguro em nada
para segurar os monstros
que habitam em mim.
Será que algum dia conseguirei abraça-los?
Busco a virtude da raiva no vento que entra pela janela
e me acaricia a nuca.
Me sinto velha.
Tenho, sei lá, algo em torno de trezentos e cinquenta mil anos
e já não me lembro de tanta coisa.
Estou cansada de ir e vir, mas continuo...
E sei que ainda guardo sangue nos olhos.
Moro no buraco fundo do mundo,
onde a pele já não me serve mais de cobertor.
Não sinto mais o vento.
Sou o vento.
Sopro por sobre as calcificações
e meu trabalho hoje
é corroer tudo o que é sólido
e balançar os cabelos do mar.
Já não falo a língua dos humanos
e deixei de me importar com a luz ou a escuridão.
Apenas sopro.
Mas sopro.
Deixei de sentir.
Não durmo,
não luto
não discuto política,
nem invisto na bolsa de valores.
Não bebo.
Os gêneros não me importam,
nem as cores.
Sou ar e ainda respiro
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2. |
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Balbucio palavras bolhas
Para aguar a boca
Babo
Gotas de saliva
Gotículas virais invisíveis
Pregnâncias no tecido estampado
Destapo o último buraco mucoso tapado
E reconheço pelos os olhos aqueles
Pra quem os covardes bradaram:
Vândalos.
A hora é sempre boa pra baderna
A hora é sempre boa pra mergulhar na agua, na boca
E boiar mirando o céu
E transar mirando o céu
E deslizar no céu
A língua
A lambida d'oxum
A vima que brilha na baba cósmica do beijo da gente
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3. |
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Lá fora o mundo grita por mim
Aqui dentro eu grito pelo mundo.
Quanto mais gritamos
mais roucos ficamos
Quanto mais roucos ficamos
menos nos escutam
Quando menos nos escutam
mais nós gritamos
Quanto mais nós gritamos
mais roucos ficamos
Quanto mais roucos gritamos
menos nos escutam
Quanto menos nos escutam
mais de nós gritamos
Quanto mais de nós gritamos
menos roucos ficamos
Quanto menos roucos ficamos
mais nós gritamos
Quanto mais nós gritamos
mais tempo dura o grito,
ainda que seja rouco.
Um dia perderemos a voz
para ganharmos a vez
e diremos em silêncio
o que tanto gritamos
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4. |
Agora - Liz Braga
04:01
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Dormir não tem sido fácil,
nada fácil!
Passo horas me revirando,
convidando o sono,
ouvindo a trilha sonora
da história que eu poderia
começar a criar
para conseguir
enfim me adormecer...
É um pouco a hora da tristeza,
resultado talvez do constato,
que mais um dia se passa
e no entanto,
ainda não sabemos
o quanto teremos que esperar
para que esse momento estranho
acabe.
O passar dos dias
não deixa também de me lembrar
que a vida também anda passando
e que o impasse é inerente
a isso mesmo no agora.
Minha lágrima parece quente,
como se tivesse ficado por um período particular no olho,
deve ser pela angústia dilatada
no tempo que temos de sobra.
Não tenho chorado muito,
ou,
não tenho chorado o tanto
que o estado de espírito atual
anseia.
Antes do fim do mundo
eu chorei por "mais de ano",
todo dia,
às vezes muito.
Acho que só parei de chorar no carnaval,
ou talvez um pouco antes.
Devo ter gastado toda lágrima
sem por tanto
ter deixado de sentir
tudo aquilo que me fazia
desaguar ainda a pouco.
Pode ser a concretude das dores
a ladra discreta do choro...
Tenho me comunicado mais
com as pessoas distantes
do que me parece recorrente...
E no entanto,
a distância nunca me pareceu
tão real..
E isso me faz entender
do porquê
de evitar o contato constante
mesmo de forma inconsciente.
Defesa.
Necessidade de não tornar fatídica
a distância.
A dificuldade eterna
com despedidas...
A falta.
A saudade.
Mas a saudade pode ser matada,
pouco ou muito.
Mas a falta é um vazio que ficou pra trás,
que não pode ser preenchido.
É o que perdi
por não estar presente.
Acho que eu tenho é chorado seco,
deve ser isso!
E acho que a cabeça anda
cheia demais
pra se deixar repousar
facilmente no sono.
Acordar não tem sido fácil,
nada fácil!
Começar um novo dia
que será provavelmente
um tanto quanto
igual a ontem.
Interromper o mundo dos sonhos
onde,
vira e mexe
vivo coisas mais interessantes
do que acordada....
Sair do estado
de ausência de dor no corpo
e de julgamento da outra dor.
Esperar o sol
que só vem esquentar de fato
mais tarde.
Desejar sem grandes expectativas
um bom dia.
Mas as coisas já perderam muito
da graça
que eu inventei
que tinham,
pra me convencer
em manter uma certa calma
aproveitando a idéia
de qualquer alegria.
Por trás dos ruídos sonoros
próprios ao lugar,
tem um silêncio profundo...
Não sei bem se ele vem de mim
ou do mundo.
Observo toda cor do além íris
que insiste em enfeitar
a flor
que nasce na rachadura do concreto.
Penso no que a planta resistiu
pra aparecer por ali.
E não consigo dar nome a sua cor.
Não consigo captar
se a imagem me traz
esperança, desespero ou alívio.
Provavelmente tudo junto
e necessariamente
em desordem.
Bom dia!
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5. |
Segue - Sara Cabral
02:41
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A hora parou de fora...
e de fora para dentro
mudaram as oportunidades, as necessidades, os convívios , a solidão e a solitude mesmo esta não tão provável no momento...
E pras curas, tempo...
E para o companheiro, nova distância . Escolhida por lá, como assim é feito praxe.
Pros olhares de cá...
des-povo-amento mas amplitude em mato.
Matos aqueles mesmo! De verdade! Verde, que brota, que tá espalhado , sem depender de gente nenhuma. E é de morro ! De baixada, daqueles que ocupa...
As políticas não esperam o tempo. Avançam, mudam de lugar, vem se repaginando tomando conta e espaço até do que não cabe a elas. Partidas também pelos partidos e detentores dos maiores umbigos já divulgados na nação .
- "E daí?" ,para o dono da imposição de seu vaidoso querer, banaliza o público. "E daí?”. Atrofiados e rígidos acham coerência numa forçada regência que nem mesmo o impositor acredita.
Humanos replicam clamores por cuidados ; outros banalizam .
Enquanto isto o mato adentro segue sua rotina na batalha pela sobrevivência de toda uma gama que deriva de si. Sem cobrar. Sem depender diretamente dos tão menores humanos que com as suas mentes se acham altos e promissores .
Da perspectiva do verde... quem pede impulso ou aparência?
Segue ... sem a necessidade de se mostrar maior .. Segue.. somente sendo, ...até que uma hora os evoluídos do macaco, percebam que sempre foram menores, sem serem diminuídos por isto.
E lá no mato, o tempo continua ...
Segue, né?
Segue ..
Louvada seja esta consciência continua...
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6. |
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21 de Abril
As ruas desertas
O sol rasgava o horizonte
O frescor
O dia me persegue num jogo de esconde
Ele me alcançar por trás das casas, postes, muros altos
Eu vou, veloz em minha bicicleta
Eu ia
O chão a correr
O pássaro voa da ponta da arvore até o monte de lixo
O canto da rua
O canto da mulher que come lixo
O conto dos freios da minha roda
Suspende o ar
Paro de frente a um cavalo
Preto de patas brancas
No meio da rua, banhado de sol
Olhar triste
Eu e ele
Somos íntimos dessa dor
Eu te reconheço animal, em mim
Sigo, sigo porque a de se viver
Sobrevoam os urubus
A névoa sobre a montanha
O rio fétido
Eu te reconheço rio
Você corre, eu corro em ti
Sigo, sigo porque a de se nascer
Pedalo sem as mãos
Me equilibro entre cacos e buracos
Sirenes, vermelho, homens
Homens e armas
O corpo estendido
Um corpo apagado
Um homem
Ao lado
Sua morte
Não avia mais o medo em seus olhos
Ele mirava o mesmo sol nascente que eu
Sigo porque a de se morrer
Sigo porque é só
O caminho é só
Subo até o mais alto da montanha
O sol me segue por entre as ruas
Os carros
A cidade a dormir
O fétido somos nós
A negar a morte
Somos nós a negar a vida
Olho a montanha de longe
Ela me olha
Eu penso raiz
Cheiro terra
Cheiro tudo que pulsa..pulsa..pulsa ... pulsa
Ser outros pulsa
Não ter nome pulsa
Ser o encontro
Ser o vento que lambe a poeira do chão
A gente nasce pra morrer
A gente morre pra nascer
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7. |
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Nao me de a mão
Nao se aprochegue
Nao respire perto de mim
Eu posso te infectar
Com o meu olhar
Refugiado a morte
Africa do Norte
Sobrevivente as correntes
Atlantico do sul
Aldeia inteira adoeceu
Quando voce chegou
Palmos da terra
Pra semente em decomposicao
Meu pouso eh breve
Eh passagem
Vou seguir viagem
Proutro plano
Onde me AGUArdam
Meus ancestrais
Falei demais
Tenho de ir
Nao me aperte a mao
Nem olhe para tras...
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8. |
Picado - Vinheta
01:36
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Vinheta com áudios gravados pelo o celular, entre Lisboa, Aielli e Berlin em 2019.
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